O artigo que segue é de Miguel Esteves Cardoso. Trata com elegância e lucidez um assunto que é tabu na nossa sociedade: a morte e a sua redutora inevitabilidade.
Não existe nada que nos obrigue a ter uma morte em sofrimento, quantas vezes insuportável:
A maior celebração da vida está nas crónicas de Laura Ferreira dos Santos no PÚBLICO. Defender a morte assistida de quem já não pode viver bem não é defender a morte: é defender a vida. A Laura pensa tão bem l como escreve. Encarregou-se, elegantemente, da tarefa mais difícil que se pode imaginar: convencer-nos que continuar vivo, quando se estaria melhor morto, é uma crueldade para quem está condenado a morrer horrivelmente.
As mortes boas - sem dor, sem sustos, sem aflições - são ainda mais importantes do que as vidas boas, porque fazem parte delas. Viver bem e morrer bem estão em harmonia. Viver bem e morrer mal é tão estúpido e injusto como viver mal e morrer bem.
A Laura quer ter "uma morte pacífica, sem uma terrível sensação de falta de ar, de hemorragias, etc, tudo o que qualquer um de nós receia na hora da sua morte".
Ela quer morrer quando quiser, mas com uma generosidade e uma inteligência que transcendem o egoísmo e ambicionam nada menos do que mudar a nossa mentalidade, para o bem de todos nós, que coincidem completamente com todos os seres humanos que irão certamente morrer.
Na crónica no PÚBLICO de anteontem pergunta "Algum médico português me explica por que é que as nossas mortes têm de ser tão cruéis?" Mas, com maior verdade ainda, conclui que "é mais de temer que o amor dos familiares 'obrigue' alguém a aceitar a vida de que já teria desistido há muito". Não pôs aspas em amor. Mas pôs em 'obrigue'. Está tudo dito.
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